Retalhos de uma vida - Livro do autor do blog

http://www.bookess.com/read/7054-livro-retalhos-de-uma-vida-/ ISBN - 978-85-8045-076-7 Definir um livro pela resenha é um fato que só é possível quando o livro realmente apresenta um conteúdo impar, instigante, sensível, inteligente, técnico e ao mesmo tempo de fácil entendimento....e Retalhos de uma vida, sem sombra de dúvidas é um livro assim. Parabens, o livro está sendo um sucesso. Ricardo Ribeiro - psicanalista

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Eternamente crianças

O ditado popular afirma que palavras são levadas pelo o vento, que nos parece querer dizer que só os atos são a prova do caráter do indivíduo.
Não devemos por isso acreditar nas palavras ditas, e por vezes malditas saídas da boca de um corpo em aflição, que não consegue transformar a sua interioridade e expele o veneno de que se alimenta.
Tem a sensação de alívio, julgando ser a cura, quando o mau estar tende a persistir e está instalado, apenas não é sentido agora de forma tão intensa, dando a sensação de bem estar.
A cobra também tem momentos de passividade, em que é dócil e meiga na sua convivência, como na Índia por exemplo, ou em tantos outros pontos do planeta, em que o ser humano as parece encantar.
Ou ambos se encantam ?
A maioria não quer saber dessas coisas, nem consegue observar as cobras dessa forma, mas apenas que aquele animal é possuidor de veneno que pode afetar qualquer outro.
A idéia que se tem acerca de qualquer coisa tende a permanecer e é independente das outras qualidades que possa possuir, e por ela é classificada.
Não somos mais crianças o que nos poderia conduzir a uma atitude elevada de considerarmos outras possibilidades, mas continuamos aprisionados a determinada idéia.
A cobra é venenosa, nem por perto a desejamos, e quando a observamos, a tendência é para a matar ou fugir dela.
Ambas as atitudes geram movimentos que qualquer animal deteta com facilidade e tende a reagir, porque algo inusitado está a acontecer.
O imobilismo de um corpo tende a passar despercebido, e é isso que todos recomendam, e que as pessoas pretendem das outras, para que possam passear à vontade a sua vaidade e complexos de inferioridade, julgando-se poderosos.
Fazer de alguém uma estátua com que se possa comunicar, falando do seu jeito, explorando as suas virtudes, como qualquer programa de computador ou a Internet, parece ser o desejo humano.
Basta-lhe a companhia de qualquer coisa que possa comunicar e manusear que não a ofenda, para que não perca os hábitos de criança, apenas os brinquedos são outros, adaptados à sua idade.
O cão ou o gato por companhia parece fazer a felicidade do ser humano quando sente a solidão, em que o animal domesticado substitui o companheiro por ser selvagem, ou porque entretanto se perdeu, e nada mais é desejado.
São evidencias que não desejamos enxergar, porque entendemos ser superiores à própria realidade que nos é presente.
O computador, o cão ou o gato, são substitutivos, assim como tudo a que nos dedicamos.
Tudo se transforma e nada se perde.
Podemos deduzir que só nos perdemos, quando não conseguimos a transformação em nós próprios.
O não conseguir transformar a obrigação de estar na sensação de bem estar, é que nos atormenta.
O futuro só a Deus pertence, é um ditado popular que determina algo indeterminado, que apenas aponta para a existência de uma alteração e tem uma ação transformadora.
A certeza geradora de uma incerteza, nos quer dizer, que a incerteza é a única coisa em que podemos acreditar, e, de que o ser humano pode ter a certeza.
A certeza da incerteza.
As virtudes que tenta explorar nos outros, podem não ser semelhantes às suas, mas aquelas de que necessita para ter a sensação de bem estar.
Afinal, que felicidade pode trazer a uma pessoa estar seis horas a brincar com um computador ?
Mas enquanto está parece ser feliz.
Que felicidade trará ao indivíduo estar diante da tv horas sem fim ?
Mas do mesmo modo sentimos alguma infelicidade quando sujeitos a uma obrigação de estar, quando não desejamos.
A mesma coisa que nos leva a sentir o bem estar em determinados momentos é a causa do nosso mal estar em outras situações.
Parece existir a certeza da existência dos objetos e a incerteza dos seus movimentos, que tentamos condicionar para alimentar a nossa interioridade, e nos garantir a sensação de bem estar.
Se a neurose é a certeza de uma forma imposta que foi levada à consciência, que tende a repetir-se o movimento, cuja finalidade foi determinada através da repetição, pode conduzir o sujeito á transformação em outra coisa qualquer indeterminada, em que a resistência é fundamental como forma de oposição, sendo a resultante provável dessa certeza adquirida.
A indeterminação é o desejo do indivíduo cuja finalidade é impedida de ser atingida.
O fim que foi determinado tende a repetir-se.
A determinação humana de colocar um fim em tudo, transforma a finalidade como algo absoluto, uniforme, que embora seja passível de transformar-se não se pretende que o possa ser.
O movimento rumo ao infinito foi interrompido, e o finito parece causar no ser humano a sensação de mal estar, por cortar-lhe a liberdade do movimento e o condicionar a uma forma de pensar e estar.
A instabilidade é provocada pela estabilidade, e esta se impõe após um período de instabilidade, em que o movimento acontece não tendo em conta os limites impostos pela estabilidade.
Pretende-se limitar os outros porque entendemos os nossos próprios limites, e nos servimos deles como instrumentos para atingir determinada finalidade por incapacidade própria.
Eis a criança incorporada num corpo adulto, em que se faz notar a total dependência em relação ao outro.
A exigência da presença do outro, tem a ver como o movimento que não consegue realizar de modo próprio, e por isso tem alguma dificuldade em estar sozinho, em que tem consciência do finito.
È a imposição de limites que ele não consegue ultrapassar e por isso tem a sensação de mau estar, em que o outro é o instrumento de que necessita para continuar o movimento agora de modo indeterminado e ao sabor do alheio.
Não parece que seja o indeterminado que causa mal estar, mas antes o determinado.
O quarto escuro não determinada nada, mas quando determinado por alguém que afirma estar lá um fantasma que o vai matar ou provocar algum mal, o mau estar aparece.
O adulto saberia que por detrás daquela porta não existe nada, a não ser os objetos reais que estão para além dela, mas ao acreditar que existe uma forma virtual e imaginária, ele é o pensamento de criança em corpo de adulto.
A droga e o álcool, transforma os limites em algo indeterminado, sem limites, e por isso o ser humano nesse momento tem a sensação de bem estar, de felicidade.
A ciência, a investigação, a filosofia, o saber e a arte não tem limites e talvez por isso as pessoas tendem a ser felizes e a criar.
O objetivo como referência, e não como valor absoluto, garante toda uma série de ligações, que não um fim determinado, o que permite o movimento e a sensação de bem estar.
Como podemos enquadrar os valores morais, segundo esta perspetiva, parece ser a grande questão e o desafio deste século.
A raiva é um sinal de impotência de quem julga ter poder.
O indivíduo não tem consciência da sua impotência, mas consciente do seu poder tende a exercer pressão sobre o outro, quando não consegue seus intentos.
Significa que a estrutura formativa apresenta uma idéia determinada,objetiva, o poder.
Lutar pela posse de qualquer coisa, mesmo ideias que seja, é próprio da criança, que ao ser proibida chora e esperneia, deita no chão, aborrece e chateia meio mundo, na tentativa de obter o seu desejo.
Se a criança deseja a posse dos objetos e por eles luta sem entender nada acerca deles, do mal ou bem que lhe possam causar, o mesmo acontece com o adulto quando utiliza o cartão de crédito e tem alguma dificuldade para pagar os seus desejos.
A frustração manifesta-se através do corpo, seja criança, adolescente ou adulto, a agitação é observada, assim como a apatia em alguns casos, em que todos sentem a impotência e tendem a ter uma resposta ativa ou passiva em relação a ela.
Se a criança sente a impotência perante as atitudes do adulto, que tenta determinar o seu próprio sentido, o que emerge é a reclamação por algo que a satisfazia ou julga satisfazer.
Num segundo passo tenta lutar contra a oposição, mas sente a impotência em levar por diante suas intenções porque algo mais forte que ela o impede.
Quando atinge a plenitude do desenvolvimento físico percebe ter tanta força como os demais, e não se faz esperar os resultados.
Aquele que foi sempre sujeito ao poder e sentiu-se impotente, o não compreendido tolheu o seu desenvolvimento psíquico, sente-se afetado quando algo o faz recordar e aprisionar a essa idéia de impotente, que não deseja.
Ele é, mas não deseja ser.
Nota-se a impotência face aos seus desejos.
È uma atitude de defesa face aquilo que entende ser uma agressão.
Reage perante os desejos dos outros ou atitudes sem qualquer significado, porque entende imposições ao seu próprio desejo de ter poder.
O que não deseja, o poder dos outros, o faz falar de um modo e agir de outro.
A fala transmite seus desejos.
A ação determina sentimentos, os não desejos incorporados, dos quais não se consegue libertar.
Somos colocados perante a realidade e o virtual.
O virtual é algo que emerge como desejado, e só a realidade, o acontecido, nos consegue dar a verdadeira dimensão de uma postura psíquica face aos acontecimentos.
Talvez por isso os heróis virtuais tendem a aumentar a cada dia, como forma de realização pessoal, devido a uma impotência sentida que os impedem de afirmar-se face à realidade.
A necessidade de afirmação do ser humano parece evidente, e perante a impossibilidade tenta criar uma possibilidade.
O sistema apresenta sempre um sentido de autonomia, de adaptação face à realidade, o que não significa que o consiga ter em absoluto, mas o terá de algum modo em muitas ocasiões.
As possibilidades e a liberdade parecem andar de mãos dadas, e o sujeito quando aprisionado tenta libertar-se, e nem sempre pensa nas atitudes e consequências posteriores, movido pela realidade imediata.
Apresenta consciência em relação ao ato que tolhe seus movimentos, o aprisiona, e tudo o resto à posteriori são probabilidades que podem vir a acontecer.
O que virá depois, só Deus sabe. O futuro a Deus pertence.
Coloca-se então a lógica proveniente de princípios, que mais além tende a refletir-se como sendo a probabilidade transformada em ação.
Lógica existe em qualquer circunstância, apenas devemos entender de onde ela é proveniente, quais os princípios em que ela assenta, sendo o movimento que tem em conta uma referência, cujo desenvolvimento tem em atenção tais pressupostos.
A certeza é o fim da dúvida, mas também poderá ser o inicio de uma frustração, que poderá ou não vir a acontecer.
A certeza da resultante não existe, mas apenas a probabilidade da sua existência.
A dúvida persiste quanto ao resultado final, mesmo tendo a certeza dos fatos anteriores.
São as certezas produzidas pela mente que nos provoca a sensação de bem estar, em que a frustração não será mais que essas certezas derrubadas.
Só sei, que nada sei.
È uma frase célebre de um homem sábio, que tinha a certeza da sua própria ignorância.
Podemos ser felizes com as dúvidas ?
O homem das dúvidas, o Filósofo, poder ser feliz ?
Desde que tenha a certeza da dúvida, em que apenas se rege pela convição dos seus princípios e conceitos.
A questão parece prender-se fundamentalmente com a finalidade de um projeto, que parece não ter fim.
A certeza parece funcionar como algo que coloca um fim, que determina algo, atingindo a sua finalidade e por isso esgota-se em si própria.
Ao persistir a duvida, a sua função permanece ativa, exige uma constante atenção psíquica, mesmo que exista uma dificuldade para a sua compreensão, e em atingir a sua finalidade.
Diferente será a dúvida da certeza neurótica.
O sistema não caminha para a uniformidade, mas para o semelhante, em que nada é igual ao que fora antes, em que os opostos surgem como parte importante da cadeia de uma transformação constante.
Eternamente crianças, não tendo a certeza de nada, convencidos que de tudo temos a certeza.

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