Não acreditem no que lhes digo, nem sequer, á partida neguem o que vos desejo transmitir, dado que estou sujeito, como qualquer outro ser humano ao erro e acerto.
Tentem perceber, se aquilo que vos estou a oferecer tem algum fundamento, e, a que princípios estão vinculados.
Uns dizem, que por preguiça mental acreditamos em tudo, desde que o autor nos mereça credibilidade. Mas tenho para mim, que isso não corresponde ao sentir interior do indivíduo que é crente, mediante as aparências, em que é levado a essa forma de estar e entender a vida, devido a uma resultante, derivada de formas sentidas anteriormente.
O crente não é burro, nem menos inteligente que outro ser humano qualquer, apenas vive com o estigma cravado na sua personalidade, que o leva a esse lugar, que o fez crente.
O emprego da palavra, crente, é abrangente, e não existe a intenção de a relacionar com um assunto determinado, dado que a crença faz-se sentir nos mais diversos campos da atividade humana.
Ele transporta consigo desde a infância esse estigma, devido a uma impossibilidade criada através da formação que o condicionou, que o negou como indivíduo, que não o fez sujeito, mas a que está sujeito e submisso, eterno obediente ás inibições, devido a tanta proibição de que foi vítima.
È um indivíduo castrado de forma artificial, das coisas de sua própria natureza, que o proibiu de empregar o princípio de racionalidade, quando confrontado com uma figura, entendida como possuindo mais poder que ele.
É este complexo de inferioridade embutido desde as primeiras horas de vida terrena, que garante ao indivíduo a sensação de abandono, que apresenta como resultante a procura de alguém, ou algo mais poderoso que ele, para que ela não se faça sentir, correspondendo a uma satisfação interior momentânea, circunstancial.
Porém, quando as circunstâncias tendem a ficar alteradas, ou de forma brusca se alteram, tal sentimento de abandono emerge das trevas, faz sua aparição, como um cenário recordado, com cenas de um presente não desejado.
Não parece que seja a ausência do objeto que aflige o sujeito, mas a incapacidade própria em gerir uma nova forma de relação, pelo que sente a necessidade de reclamar por um objeto, que lhe garanta a sensação de proteção, em que dessa forma, é dissolvida a sensação de estar abandonado.
É este complexo de inferioridade, transmitido como se fosse uma bactéria que se instala na interioridade do ser humano, que forma a ambivalência, ocupa o espaço nas extremidades, deixando livre a zona intermédia, que poderia garantir alguma tranqüilidade ao indivíduo, desempenhando um papel de mediador.
Quando colocado num extremo, enxerga outro, como superior ou inferior, e não como semelhante, em que sente a superioridade, perante aqueles que julga mais fracos, e torna-se submisso diante de alguns outros, que entende possuírem mais poder e conhecimento.
O questionamento fica comprometido tantas vezes, e muito mais a indagação, dado que o poder não deve ser questionado, pensa por ele, em que apenas resta ao ser humano, a submissão ou a contestação, entenda-se negação, sem que possamos perceber uma luz de racionalidade, mas simplesmente uma força reativa.
Apenas a revolta interior, como poder reativo, que podemos encontrar no âmago dessa relação, sujeito / poder, que por vezes resulta em rebeldia, revolução, transgressão, podendo destruir o seu semelhante, cuja finalidade é a tentativa de libertação daquele que se sente escravo.
Porém, escravo continua, dado que só o poderá deixar de ser, através de uma evolução intelectual, e não por empregar a força bruta motriz, na tentativa de levar por diante os seus desejos mais íntimos.
De onde resulta, que a liberdade sentida no corpo, parece ser distinta, daquela outra, que é dada ao pensamento humano, e talvez por isso, uma vez liberto, sinta ao fim de algum tempo, uma certa insatisfação, dado que não entende para que serviu tal movimento de libertação.
Mas o que podemos entender por evolução intelectual ?
Abarcar a maior diversidade de temas?
A procura de forma incessante de conhecimento?
O estar sempre atualizado, com as notícias do dia a dia, do nosso e de outros mundos?
Decerto, que tudo isso pode, e, é importante, que serve á evolução intelectual.
Mas que dizer, das proibições, das coisas que nos impuseram como proibidas, tabus, que uma vez servindo a um bloqueio mental, não pode de forma alguma seguir o seu processo de evolução intelectual?
Como podemos conectar, o que á partida nega a própria conexão com outras idéias?
Somos levados por isso ao entendimento, que ao existir um bloqueio mental, derivado de tabus, o processo intelectual cessa por aí, fica condicionado e associado, ao que não pode ser falado, nem levado em consideração, porque proibido.
A porta de saída para o ser humano, como fuga a uma impossibilidade sentida na mente e no corpo, que restringiu o sentido de vida, é a procura do desenvolvimento do intelecto por outra vias, que nos permite perceber em tal atitude a tentativa de sublimação, porém, mal sucedida, deixando atrás de si o rasto patológico da proibição, e da ignorância.
Lembro aqui, as pessoas que estão em permanente atualização, que apresentam um currículo invejável, recordam os autores e as frases mais badaladas, mas continuam a sofrer interiormente, e a sentir uma dor profunda, de algo que não conseguem entender, nem explicar, sempre agitadas, á procura de algo, que é sempre nada, que possa garantir uma certa paz interior.
A paz interior, só a conseguem sentir durante esse processo de atualização constante, porque quando lhes falta, regressa a dor e o sofrimento, devido a relações que não entendem.
São os eternos insatisfeitos, apesar de todo o seu conhecimento.
A intelectualidade, tal como é entendida em geral, não pode ser considerada em psicanálise, a não ser como deslocamento da neurose, dado que constitui uma forma artificial, que não natural, de evolução humana.
A intelectualidade é uma conseqüência desta forma natural, que faz o indivíduo trilhar os mais diversos caminhos, tendo em conta os princípios da matéria, de que são originados.
Não estamos a falar da função, que é imutável, mas de concepções artificiais, e, de princípios derivados da própria natureza das coisas, que apresentam por isso, desenvolvimentos intelectuais diferenciados.
Estamos a falar de um produto natural, o homem, enquanto ser animal, e de um outro, que pode constituir-se em humano ou não, dependendo das circunstâncias formativas a que for submetido.
Em ambos podemos constatar a evolução, mas também podemos observar em cada um deles, formas diferenciadas, distorcidas e bloqueios, sempre vinculadas a sistemas mais ou menos equilibrados ou rígidos de formação, cujos efeitos a psicanálise estuda, investiga e procura entender.
Se o corpo se escuta a si mesmo, e emite sinais ao indivíduo do que está sentindo, embora este, tantas vezes, não perceba porque sente, o que sente, e, o que o faz possuir sentido, como um tabu proveniente do exterior é incorporado, segue as mesmas orientações de um corpo que sente, e o indivíduo não consegue pensar, para além do próprio sentido?
Enquanto persistir o medo, o indivíduo não pensa, apenas reage, que confunde com o pensamento.
A negação contraria o pensamento, pelo que somos a considerar, que enquanto ela persistir, não existe lugar para o pensamento.
O pensamento deriva de uma atividade mental sem bloqueios, da possibilidade de afirmação de algo, ou de alguma coisa, que satisfaça a interioridade humana, cujo bloqueio a contraria.
Pode existir a imaginação, muito embora ela seja produzida, através de algo alheio ás nossas próprias sensações, dado que nos foi conferida por outros, o que tende a distorcer a nossa própria realidade.
Desse modo, somos convidados a viver a vida de outros, que não a nossa, para regozinho e satisfação de alguns, nos considerando então, como meninos bem comportados, merecedores de atenção.
A aliança com o poder, transmite á maioria das pessoas a idéia de possuir alguma importância para os outros, dado que ela própria sem isso, sente que não é importante, nem para si, muito menos para os outros.
O que não parece entender é a sua negação, que nega a si mesmo, a favor de um outro, que de outro modo seria semelhante aos sem abrigo, que uma vez abandonados, ou abandonando-se a si mesmos, vivem e dormem na rua.
A negação, não faz do repertório do pensamento.
sábado, 19 de junho de 2010
O estigma das proibições
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