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Analizzare – Centro de Estudo e Pesquisa em Psicologia e Psicanálise
Psicanálise, clínica, e as faces do desejo.
É meu desejo, o desejo que não desejo. É justamente a partir do não desejo, que surge o desejo em psicanálise, dado que toda a organização biológica e psíquica se pauta pelo princípio da satisfação e prazer, em que o desejo do psicanalista se torna irrelevante, face ao desejo do paciente. O desejo sucumbe com a realização, e a análise já não tem razão para existir, quando o analisando encontra o bem estar interior. A negação desaparece, porque vencida a resistência se deixou invadir por um outro desejo, ignorando o não desejo. Falar de desejos conscientes como última etapa de um percurso psíquico, é não enxergar, e tentar ocultar outros desejos que se tornaram inconscientes, que se revelam apenas como sentido.
Não parece que exista contradição, mas antes, a tentativa de afirmação de desejos conscientes e inconscientes, que coexistem no interior do mesmo sistema psíquico, que não se anulam, nem se contradizem, em que a diferença de potencial entre ambos tende a revelar um em detrimento do outro. Não existe a falta do desejo, mas apenas a sua não realização, tantas vezes por impossibilidade devido à ausência do objeto que permita realizar seu desejo, constituindo-se em obsessão, quando existe o não desejo, que é desejo do sujeito, em não desgrudar-se do objeto, mesmo que esteja morto. O sujeito não possui o desejo de encontrar um elemento substitutivo, permanecendo a energia ligada ao objeto perdido, pelo que o deslocamento da energia fica por fazer, negando por isso outros desejos, que se transformam em não desejos. A aparente falta de desejos que observamos em determinadas pessoas, que podemos perceber cada vez mais na análise, é proveniente de uma uniformização de determinado campo de ação, que para além dele nada pode ser desejado, em virtude do desejo estar circunscrito, lhe negando na formação infantil a experiência de outros desejos.
O desejo inconsciente é interior, agregado ao próprio corpo, tornando-se em afirmação do Eu, que um desejo consciente, derivado de fora, tenta aniquilar, em que o conflito não se faz esperar, entre desejos e não desejos. Podemos avaliar, embora sem exatidão, se tal desejo pode ser preenchido, daí o vazio, ou se, simplesmente o sujeito através da análise transforma tal desejo, em não desejo, porque de outros desejos é possuído. Parece ser justamente a interposição de outras formas de percepção, quando incorporadas, ou de outras formas de sentir, como terceiro elemento, que pode dissolver o conflito, ou o aliviar, que pode levar a uma distribuição da energia do corpo segundo um novo processo adotado. Tal processo tende a destruir o quadro ambivalente, em que os aspetos valorativos são conferidos por esse terceiro elemento, então incorporado, em que já não está em causa a ambivalência, afirmação e negação, transformando-se em probabilidades valorativas. Com a incorporação desse terceiro elemento foram desfeitos esses dois polos extremados, cuja valorização perdeu sua intensidade, apresentando agora a distribuição de energia uma outra configuração.
Estamos a falar de forças interiores, como seja, a da vontade, que se expressa de forma primária por uma necessidade ou desejo, atingindo uma rede complexa evolutiva, cuja tendência será perder de vista o desejo original, de cuja força depende o não desejo, como causa da possível patologia. Significa, que um não desejo, tanto serve à cadeia evolutiva normal de um complexo, como pode provocar algumas alterações, que uma vez sentidas de forma intensa pelo corpo, derivam em agressividade excessiva, violência e destruição dos outros, ou de si mesmo, revelando-se, por isso, patológica.
O psicanalista procura o terceiro elemento, que possa servir de mediador, e o revela ao sujeito, mas não é garantia, de o transformar em desejo de seu desejo, porque de outros desejos pode ser possuído. Ele saberá melhor que ninguém quais os seus desejos, existindo, porém, algum fator que impede o sujeito em sua realização, devido a uma incapacidade própria de potencializar seus desejos, face à pressão de outros desejos. O desejo de reparação, de reparar alguma coisa, desejos voluptuosos perturbadores, por isso, não permitidos, desejos sexuais com crianças, desejos recalcados por lembranças infantis, desejos sexuais e aversões adormecidas no coração, desejos realizados através dos sonhos, nos dizem da complexidade de desejos e não desejos, que impedem a livre circulação da energia de um corpo, interrompendo seu movimento livre, ou até mesmo o bloqueando.
A teoria de Freud nasceu da percepção dessa impossibilidade do desejo em realizar-se, cuja resposta é física e química, uma vez o psíquico grudado a desejos julgados pelo sujeito, como impossíveis de serem realizados. A liberdade de movimento de um corpo é colocada em causa, em que o sintoma apresenta a particularidade de isolar, o que não se pretende que afete o todo, sendo esta uma forma de preservação inscrita na própria lei da natureza. Porém, a parte afetada causa algum incomodo, daí o transtorno, em que o corpo encontra-se fragmentado, esperando reparação, que só pode dar-se através da realização de desejos, que uma vez não conseguida, pode realizar-se através da fantasia, e da realização virtual através dos sonhos. Detectar as inibições, e onde estão agregadas, pode ser um caminho, mas ainda insuficiente para libertar o desejo, dado que elas podem estar associadas a outros desejos, que possam ter um grau de valorização superior.
Não existe dinâmica psíquica perante as necessidades de um corpo, pelo que ela só se faz sentir quando o fator inibição se interpõe entre a vontade de um corpo, e uma vontade exterior a si mesmo, o impedindo de realizar seus desejos. Por isso, não é o interdito que está na base do desejo, dado que este é promovido através da alucinação, que possui uma evolução própria, o que nos é dado a observar é que ele se torna mais intenso, a partir da negação de sua realização. Este será o verdadeiro quebra cabeças, não só de toda a análise, como também da forma de conduzir a formação infantil, tentando encontrar outras maneiras de conduzir todo o processo evolutivo da criança, sem a transformar num não desejo interior.
Por último, gostaríamos de salientar, que toda a vida psíquica depende da uma relação objetal primária, formando um mundo de emoções, sensações e sentimentos, que uma vez incorporados, se transformam em desejos mais ou menos intensos.
Por outro lado, sabemos bem, que sem essa relação com os objetos exteriores não existiriam formas de vida, pelo que o experimento é condição natural de qualquer ser vivo. Será essa intensidade sentida de forma exagerada no corpo, responsável pela obsessão desejante, cuja energia ligada forma um elo de difícil remoção. Não deseja, nem deixa de desejar quem quer, dado que o desejo incorporado é sentido interiormente, e tende a refletir-se no exterior. Somos a salientar a importância da pulsão de vida relativamente à pulsão de morte, em que esta será o não desejo, que tende a impulsionar o desejo.
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